02 julho 2012

ESPECIAL CLUBE DA ESQUINA



É difícil escapar do coro: é realmente ‘paudurescente’ – obrigado, Lobão – a Globo transmitir uma coisa como essa. Mas assistir isso na hora em que foi exibido é como esperar ansiosamente pelo próximo episódio do Telecurso. Viva o Youtube, o povo paraguaio e a seleção da Espanha.

Duas observações: a primeira para o estagiário da mesa de edição. ‘Fernando Brandt’ é um empresário têxtil. A segunda é sobre o “adeus ao velho barroco mineiro”. Ficou engraçadinho. No mau sentido. E não achem que essa é a coisa mais chata que direi aqui.

Mas que se registre antes de mais nada: mais vale um especial Clube da Esquina do que 20 ou 30 anos de Show da Virada.

1 – Para Lennon e McCartney (Milton e Lô)

Lô Borges sem guitarra é uma grande perda de tempo. É duro ver uma cena como essa em qualquer lugar. Se no meio da transmissão Marcio Canuto aparece falando das gostosas do carnaval de Olinda, veremos que o boneco de 3 metros de Carlinhos Cachoeira ali atrás tem mais jogo de cintura que nosso gênio orelhudo. E o que dizer do sr. Nascimento. Certa vez fiz um texto contando o quão constrangido eu ficava a cada aparição nascimentiana na televisão. Era um negócio realmente agressivo, determinando o absoluto fim de sua carreira e a ainda mais absoluta necessidade de que ele revisse seu visual Stevie Wonder de plástico. Aqui ele não fede nem cheira. Assim como essa canção, que já deu o que tinha que dar. O batuquezinho do introito é só uma forma que arranjaram de expressar um ‘estamos tão cansados de ouvir essa trolha quanto vocês, mas a gente tenta se divertir’. Lô, meu brother, arranje uma fucking-guitar e me grave outro “Um Dia e Meio”. Miltão, não quero mais te ver, cara. 


Ói o remelexo do moleque...


2 – Tudo o que você podia ser (F. Takai e As Minas)

Que é isso, véi. Que coisa linda. Pela primeira vez estou pouco me lixando para o incômodo de saber que não compraria um disco dessa banda que acompanha a Takai. Esse sonzão ‘Cidadão Instigado encontra o Kassim no seriado do Shaft’- embora eu pague pau pra várias ideias do Kassim – nunca me atraiu. Mas seria massagista,  psicólogo e roadie de calcinha quando elas quisessem. E a levada funkeada renovou a canção, deixando-a mastigadinha para o pessoal da calourada em Ciências Sociais. Boa releitura da banda e boa leitura de Takai – não dos vocais, mas da letra que estava impressa no suporte mesmo. 

A prima "bem comissionada" da Dani Suzuki mandando ver no groove.

3 – Sal da Terra (Felipe Catto)

Esse Felipe Catto deve ter saído do último Ídolos como a nova Daniela Mercury. Nervoso com a presença de Camila Pitanga, ele deve ter pensado em ir mais longe:  imaginou o que deveria acontecer caso o My Chemical Romance resolvesse fazer um cover de Beto Guedes com o figurino de Willy Wonka. É claro que daria sarapatel. Beto Guedes cometeu vários erros na carreira – como dar entrevistas –, mas sua versão de “O Sal da Terra” é o tipo de coisa que não vai ser superada. Escolha arriscada de repertório, interpretação afetadíssima e a banda meio que se escondendo, fazendo o tipo “meu, o show é do cara aí... tenho nada a ver com isso”. Resultado: Jaqueta “A Fantástica Fábrica de Chocolate de Freddie Mercury” 1 x 0 Filipe Catto. 

Sem mais, meritíssimo.

4 - Sol de Primavera (Kamy)


E tome Especial Beto Guedes. E lá estão Jorge e Mateus para... não são? Que bom pra eles. E melhor ainda para eles é que a versão ficou à altura do desafio. Se “Amor de índio” é a Yesterday de Betão, “Sol de Primavera” é sua Hey Jude, e é o tipo de coisa que geralmente não precisa ser mais martelada. Mas aqui ninguém fez feio. E mesmo que quisessem fazê-lo, estariam lá os caras que acompanharam Milton e Lô na primeira performance para salvá-los. Mas o visual de galã de balada de um e a pegada de violão do outro não despistam: eles saíram de lá direto pro backstage de Fernando e Sorocaba.  




Os galãs mandaram bem.

5 – Paisagem da Janela (Megh Stock)


Quase ficamos Diante do Trono, mas deu tudo certo.

Vocal de gospel brazuca, background de gospel brazuca, pegada de gospel brazuca... e ficou interessante. “O que você tem contra gospel brazuca”? O gospel local é uma merda. Se nos EUA é necessário ouvir o gospel para entender o que acontecerá na black music dos próximos 10 anos, aqui é preciso ver o que de pior aconteceu no sertanejo e deixar em banho-maria por 10 anos para atingir o nível de diluição do gospel verde-amarelo. Mas Megh Stock trata a canção com carinho, e a renova com competência – e alguma irreverência. Se ela continuar assim, dá pra pagar mais ao dentista e tirar logo o aparelho.



6 – Um gosto de sol (F. Takai e As Minas)

Escolha estranha de canção. Exatamente por ser um pedaço de hermetismo dentro do Clube, que é brilhante também por causa desse colorido. Mas para um especial de televisão de canções com dois ou três minutos, ainda é uma opção complicada –mesmo que Takai, que já a gravou com o próprio sr. Nascimento, estivesse familiarizada com ela. Difícil é dispensar a segunda parte, praticamente um hino melódico dentro do movimento – e muito bem aproveitado pelas princesas. Talvez o melhor fosse começar com esse trecho indispensável e concluir com algo como ‘Nuvem Cigana’. Ponto, entretanto, para a preservação da nudez do piano. Os fãs de Gustavo Lima insones em casa precisavam saber, ao menos uma vez na vida, o significado de “harmonia”.

 7 – Feira Moderna (Felipe Catto)

Willy Wonka é mesmo uma criança irrequieta. E agora o negócio dele é alterar a harmonia. O problema é que alterar a harmonia é coisa para poucos. É corajoso, às vezes necessário. Mas quando o objetivo é tornar as coisas um pouco mais econômicas, não mata quando se tem algo para compensar – como uma pegada muito mais marcante, por exemplo. Nosso Johnny Depp de loja de departamento e sua patota não fazem isso. E “Feira Moderna” fica meio anêmica, nem rock nem rural, e restrita a ser um intermezzo sem graça desse musical sobre jaquetas que Felipe Catto finge protagonizar.

8 – Trem Azul (Lô Borges)

O próprio Lô Borges possui versões gravadas e ao vivo muito superiores a essa. O que tocaram aí foi só um registro de fadiga em torno da insistência de se executar um troço que não se renova. Só que Lô é um cara legal. Ele não quer desapontar produtor nenhum, principalmente depois que o ameaçaram de fazer um especial “Willy Wonka canta Salomão Borges”. Mas ele bem que poderia ter mandado um ‘Ruas da Cidade’, uma canção de grande apelo melódico, do repertório do ‘Clube da Esquina 2’, e que não se vê ao vivo desde... desde nunca, mermão.

9 – Nada será como antes (Megh Stock)

E como as coisas melhoram quando Reginaldo Manzotti para de olhar feio pra banda do fundo do palco e a deixa respirar. A esplêndida harmonia da canção está toda lá, e os arranjos exploram bem todo o potencial que a canção tem para vibrar um palco. Uma versão que deveria ser gravada.

10 – Um girassol da cor do seu cabelo (F. Takai e As Minas)

Lô Borges estava no estúdio essa hora. Ou ele chorou de satisfação, ou socou a punheta de sua vida. É verdade que o início desperta a desconfiança de que Otto entrará a qualquer momento. Mas depois disso o panorama econômico melhora, e muito. Além de tocarem o que tocam, as mocinhas harmonizam os vocais muito bem e encaixam na voz de travesseiro de ms. Takai Ulhoa. E o xote do trecho final é tão mais interessante do que a ingênua levada original que deveria ser adotada pelo resto da vida do nosso querido Salomão, que deve estar até hoje atrás do Facebook da japinha peituda da guitarra.

11 – Vera Cruz (M. Nascimento e Wagner Tiso)


Milton Nascimento deveria se juntar a Roberto Carlos e tirar umas férias em Andrômeda, na vizinhança da casa de verão de Baby do Brasil. Mas um sumiço assim, deixando a discografia. Wagner Tiso pode ir também, mas daqui uns cinco anos. Acerca de Vera Cruz não há muito o que dizer. As versões instrumentais de trios de jazz se empilham até a lua no Youtube. É uma canção brilhante, mas cansada. Uma canção cansada cantada por um sujeito cansado acompanhado por outro sujeito cansado simplesmente... cansa.

12 – Nascente (Felipe Catto)

Tem alguma coisa errada com esse baterista de Willy Wonka. Porque parece que o sujeito está imerso em uma eterna virada. Sua performance é exatamente isto: uma virada infinita. É por isso que as versões das demais bandas soam como canções revisitadas, e as dessa banda de Felipe, como vinhetas longas demais.

13 – Cravo e canela (Megh Stock)

Aí chega a banda pré-gospel de Megh e faz praticamente a mesma bosta quente que a banda de Willy Wonka agora há pouco. Até puxada a la Riquelme o baterista se propõe a fazer no meio da confusão percussiva que ficou isso aqui. É tudo tão arrastado que, se fecharmos os olhinhos, veremos Joyce nua e dopada cantando o tema de Pantanal dentro de um igarapé.

14 – Veveco, Panelas e Canelas (F. Takai e As Minas)

E o especial Beto Guedes termina com uma versão comportadinha de “Veveco” que, convenhamos, não dá muita brecha para gracinhas e firulas. Fernanda Takai segue seguríssima sobre o background de suas talentosas gatinhas, mas o especial segue muito longe de ter um final apoteótico. Foi válido por ser ao menos uma versão dessa canção além do esforço sôfrego e doentio de Beto Guedes de continuar executando-a por aí.