29 outubro 2011

ENTRE VISTAS E PISCADELAS II

Cine no VMB: um dos momentos mais memoráveis... de seus detratores
BANDA CINE

A burocracia das respostas e a timidez das perguntas não engana: a entrevista com o Cine foi feita por e-mail. E isso, geralmente, é uma bosta. Encontrá-los pessoalmente teria sido um must, benhê. Nem tanto por eles serem lindinhos. Nem mesmo para bombardeá-los com divertidos e leves insultos de roqueiro ultrapassado, como fez o pouco dotado de noção Régis Tadeu. Mas principalmente para verificar o que leva a sério um bando de guris capturados de um bairro de classe média qualquer de São Paulo e submetidos a sucesso súbito, perseguições a la ‘Hard Day’s Night’ e campanhas difamatórias evidenciando suas complexas inclinações sexuais. No lugar deles, com a idade deles, com a cor do cabelo deles e a falta de tato musical deles, eu não ligaria pra porra nenhuma. Nem pra e-mails de entrevista. Mandaria um assessor mal pago e frustrado responder tudo em português corrente. E iria pra piscina me masturbar. Peraí. Será que...

 “Abandonamos o lado colorido”

Em entrevista exclusiva ao Cinform, febre adolescente fala do show em Aracaju, relação com o Restart e novas escolhas


Por Igor Matheus
(Publicado no Cinform em 6 de junho de 2011)


Há quem diga que eles fazem som de 'frutinha'. Há quem aponte que eles são coisa de menininha histérica. Mas os moleques da banda paulista Cine não estão nem aí para o que falam deles. E desfrutam, sem moderação, de tudo o que o sucesso instantâneo pode oferecer. Senhores das redes sociais, líderes das redes de compartilhamento de áudio, sultões dos acessos virtuais, os cinco garotos colhem os frutos da divulgação de seus trabalhos na internet sob a forma de uma agenda extenuante de shows pelo país e aparições hora sim hora também na televisão. E para alegria das garotinhas sergipanas - e garotinhos, por que não? - com boletins em dia, DH, Dan, Dave, Bruno e Dash aportam em Aracaju no próximo dia 12 de junho para sua primeira apresentação na capital. O evento, que será realizado no The Office Pub, integra o projeto Rock College, iniciativa que tem se empenhado em trazer para cá todos os ídolos da novíssima safra de rock teen – como se fez, nos últimos meses, com as atrações Fiuk e Restart.

Só que fazer sucesso por aí usando calças coloridas apertadas a vácuo, penteados discutíveis e canções de desenho animado não é coisa para passar batida em nenhuma boa rodinha de debates. E o Cine, junto com sua similar Restart, tem mobilizado uma doentia unanimidade entre os defensores da 'moral e dos bons costumes' - seja lá o que for isso - da arte musical: todos adoram esculachá-los. Só não se sabe muito bem em nome de quê. Então, que menininhas histéricas - e menininhos... por que não? - e conservadores aproveitem a entrevista que Dan, guitarrista do Cine, concedeu exclusivamente ao Cinform no intervalo da estapafúrdia agenda do grupo. Aqui, ele fala da postura da banda diante das críticas ou implicâncias, comenta o abandono do 'lado colorido' e diz o que todos estão esperando da vinda a Aracaju no fim da semana. Confira.

Cinform - Vocês costumam citar Blink 182 e Limp Bizkit entre as referências internacionais e Charlie Brown Jr. entre as nacionais. O que vocês identificariam de similar entre o som de vocês e o dessas bandas?
Dan - De similar ao som do Cine, creio que há muito pouco. O arranjo instrumental mais 'rock' de algumas músicas mais antigas se encaixa nessas referências, mas na verdade essas bandas nos influenciaram no incentivo a querer tocar e formar uma banda. Nós somos muito fãs de todas elas!

Cinform - Como cada um se iniciou nos instrumentos que tocam? São todos autodidatas ou chegaram a estudar?
D - Acho que fui o único que chegou a estudar um pouco mais. Fiz aulas no Conservatório Souza Lima por seis meses. O Pedro fez aulas de piano também. O Dave e o Bruno são autodidatas e mandam muito bem! Acho que todos nós fomos aprendendo a tocar durante esses mais de oito anos que tocamos juntos. Mesmo antes do Cine, já estávamos juntos na estrada por aí. O aprendizado na prática e no 'se vira nos 30' foi muito mais forte para nós.

Cinform - A que vocês atribuem o sucesso na internet? A alguma estratégia específica, sorte, os dois juntos?
D - O que chamou a atenção pro Cine na internet, de início, foi que na época em que o 'emo' dominava a cena no Brasil, nós aparecemos com um som diferente, mais pop, misturando elementos de música eletrônica, sem roupas pretas e sem falar de tristeza. Chegamos com algo novo na época e a galera começou a ir atrás e acessar nosso Myspace, Fotolog, etc. Abusamos das redes sociais e tudo o que a internet podia proporcionar em termos de divulgação.

Cinform - Como é a relação da banda com o Restart, outra força desse novo movimento do rock 'teen'?
D - Não temos muito contato com eles hoje em dia. Mas na época em que começaram com esse tipo de proposta também, eles abriam shows do Cine, e o DH deu algumas dicas a eles. Fizemos muitos shows juntos, o que fortaleceu esse movimento e fez com que ele tomasse mais força no Brasil.

Cinform - Como vocês lidam com reações como a de João Gordo (que quebra o trabalho da banda em rede nacional enquanto solta toda a sorte de insultos) e de todos aqueles que os acusam de não serem mais do que uma onda passageira?
D - Lidamos da melhor forma possível, sempre com bom humor. Inclusive, conhecemos o João e fomos ao programa dele. O cara é super gente fina. E é o trabalho dele 'esculachar' as bandas. Quanto a quem diz que somos uma onda passageira, relevamos e continuamos com nosso trabalho. Enquanto uns estão sentados falando, outros estão fazendo.

Cinform - Em entrevista recente - mais especificamente para o colunista Régis Tadeu -, o vocalista DH chegou a declarar que a banda está abandonando o 'lado colorido'. Qual será então o próximo passo do Cine?
D - Já abandonamos de certo modo esse 'lado colorido' de 2009. É natural com o passar do tempo evoluir e mudar o jeito de se vestir, pensar etc. Hoje em dia, estamos mais sóbrios nas cores e mais ligados em tendências de fora. O próximo passo pode ser conferido no nosso novo CD, que sai agora no segundo semestre.


07 agosto 2011

ENTRE VISTAS E PISCADELAS I

A partir de hoje, neste blog esquecido por Deus e pelo seu próprio proprietário - não de Deus, mas do blog; mas entendam como quiser -, darei um jeito de fornecer uma mínima sobrevida a coisas que faço como editor de cultura do jornal Cinform, daqui de Aracaju. Como isso aqui não é espaço para a tortuosa ética ‘releaseira’, ou para sorrisos amarelos, compadrio, agrados, mimos, jabás, simpatias, ‘humildes sugestões’ e outras bajulações que me satisfazem muito, optarei por algumas entrevistas.

Ney Matogrosso


Foto: Arnon Gonçalves
Comecemos pelo senhor Ney de Sousa Pereira. Que é um sujeito cabeçudo, afetado, desconfiado e relativamente cansado de certas coisas. Mas que não deixou de responder perguntas. Não tinha não-me-toques temáticos, nem pediu por-favor-isso-não ou pelo-amor-de-deus-não-toque-nesta-merda-de-assunto. Sequer água pediu. Na verdade ela simplesmente chegou até ele – não, é claro, sem que nosso protagonista avaliasse o invólucro e a procedência do líquido com uma fitada de murchar autoestimas. O que interessa é que 40 anos de carreira, de mídia, de entrevistas e declarações de contramão deixaram nosso complexo frontman tão amaciado que não há questionamento que ele não digira em quatro ou cinco frases bem conectas. O que é ótimo para um jornalista, péssimo para uma transcrição, horrível para uma diagramação e excelente para o leitor, que descansa de imbecilidades que saem todos os dias de quem finge dizer alguma coisa. 

"Ser intérprete é uma vantagem"

Aflições e estímulos de um dos mais respeitados e inquietos artistas do país


Por Igor Matheus

(Publicado no Cinform em 16 de maio de 2011)

Plumas, brilhantes, um riscado mourisco no passo, gestos largos e afetados, minuciosa feminilidade vocal. Não seria fácil atribuir a alguém que se faz de instrumento da extravagância há quase 40 anos - intercalando com outras propostas, é bem verdade - razoáveis índices de lucidez. Mas é exatamente isso o que Ney Matogrosso transmite quando está desvinculado de seu alter ego de palco. Sem fazer pesar seus quase 70 anos, o intérprete esbanja consciência de si mesmo, dos atuais descaminhos da indústria fonográfica - embora confesse ignorar o que seja a 'atual MPB' - e não se poupa das sempre longuíssimas e requisitadas turnês que faz. Uma delas é justamente a atual 'Beijo Bandido', trazida a Aracaju no último dia 11 para um repleto Teatro Tobias Barreto.


O curioso é que mesmo tendo permanecido boa parte da carreira à sombra da lembrança do grupo que o catapultou – o Secos e Molhados – e transitado por inúmeras estéticas – o que aumenta seriamente suas chances de erro –, Ney Matogrosso conseguiu extrair da crítica uma privilegiada condescendência, que pode ser confundida, até, com veneração. Mesmo assim, a situação não o impede de ser um dos mais produtivos artistas de uma geração que hoje em dia apenas se requenta. Em entrevista para o Cinform realizada um dia antes de sua apresentação em Aracaju, o cantor falou de seu novo trabalho, de sua suposta 'solidão' no cenário musical nacional e revelou estar aberto a obras de compositores sergipanos. Acompanhe.

Cinform - O show 'Beijo Bandido' fará quase dois anos em cartaz. Fora a bilheteria, o que mais o instiga a permanecer tanto tempo na estrada?
Ney Matogrosso - Minha primeira meta nunca é a bilheteria. É a realização artística, é apresentar um trabalho que estou percebendo que as pessoas gostam. Não sou movido pelo dinheiro. Não vou dizer que o rejeito, que o renego, mas ele não é minha primeira meta. O que me instiga é o prazer de mostrar e de ver que ainda há gente querendo ver o trabalho que mostro. E tem mais: nunca é igual. Cada show que faço é para um público diferente. Portanto, tenho estímulos diferentes a cada dia.

Cinform - Certa vez o cineasta John Ford foi questionado sobre o significado da 'mensagem' na arte e respondeu que, se quisesse realmente passar uma, enviava um telegrama. Você acha que o artista deve ter compromisso com a transmissão de uma mensagem ou o público deve ter liberdade até para não pensar?
NM - Não quero público que não pense. Não me interessa isso. Ofereço estímulos conscientemente, e as pessoas que façam o que quiser com eles. E na medida em que elas se dedicam a se tocar pelo que eu envio, recebo uma resposta que também me estimula. Então é algo que vai e que vem. É um ciclo.

Cinform - 'Beijo Bandido' não é performático como 'Irreversíveis', último show que você
trouxe a Aracaju. Você o definiria como mais formal e comedido?
NM - Formal sim, mas não careta. 'Beijo Bandido' não é um recital. Ele até tem um repertório que poderia ser de um recital. Mas é mais do que isso. É um show de música romântica pop, em formato pop.

Cinform - Em entrevista recente, você disse que não tem costume de escutar música com regularidade. Como explicaria esse relativo 'distanciamento'?
NM - Não sei se é um 'distanciamento'. Apenas não tenho o hábito de escutar música com frequência. Tem gente que acorda, liga o som, fica o dia todo ali. Não sou assim. Gosto de silêncio, de ficar no silêncio. Não preciso de algo o tempo todo me estimulando. Fico muito bem sozinho. Quando estou procurando um repertório, aí sim, me entrego e me dedico com disciplina. Tenho uma sala em casa onde pego tudo o que quero ouvir, me sento e ouço.

Cinform - E como você avalia o atual momento da música brasileira?
NM - Não sei dizer, porque não ando escutando nada. Ouço rádio quando estou dirigindo. Então a informação que tenho do que está acontecendo é o que passa no rádio. Mas ele também não corresponde à realidade. Para tocar em rádio, os artistas precisam passar por inúmeros obstáculos. O que toca lá é o que conseguiu chegar, o que passou por todas as barreiras. Por isso que, como intérprete, vou atrás de gente que ninguém nunca ouviu: para ser um veículo de exibição de gente interessante que nunca teria a oportunidade de chegar lá. É um compromisso que criei para mim. É algo que, por sinal, não é um favor. Faço porque gosto. Faço por admirar o que me é mostrado, e não por ser bonzinho. Isso traz frescor para o meu trabalho.

Cinform - Não há artistas desenvolvendo trabalhos similares ao seu no atual cenário musical nacional. Você se considera esteticamente 'sozinho'?
NM - Não me considero nem sozinho nem acompanhado. Sou essa pessoa, esse artista, esse intérprete aqui. E ser intérprete, para falar a verdade, é uma vantagem, porque tenho a oportunidade de desfrutar de tudo o que a música brasileira pode me oferecer. Lembre-se de que não sou preconceituoso em relação a estilos musicais. Gravei forró em uma época em que cantores de MPB viravam a cara para ele.

Cinform - Tem conhecimento de algum compositor de Sergipe?
NM - Conheço a Joésia Ramos. Mas os que não conheço podem se aproximar. A Luli (da dupla Luli e Lucina) me falava de pessoas daqui. De vez em quando, peço para ela me colocar em contato com essas pessoas, para me mandar discos locais.

Cinform - Antes de cantar, você flertou com várias manifestações artísticas, que iam da pintura ao teatro. Ainda exerce alguma delas?
NM - Voltei a desenhar há muito pouco tempo. Depois que comecei a cantar, não fiz mais nada. Teatro não dá. É tão absorvente quanto a música, pois ensaia-se dois meses para ficar um ano em cartaz. Mas tenho feito algumas experiências em cinema e acabei de dirigir uma peça baseada em dois contos de João do Rio. Não me interessa ser só um cantor. Tudo o que eu achar que dá pra fazer, farei. Por sinal, foi lendo o João do Rio que entendi o Nelson Rodrigues.

Cinform - Você entrou na banda Secos e Molhados com 30 anos, uma idade relativamente avançada para quem se insere no mundo da música. Essa entrada, quando já maduro, o ajudou a fazer escolhas de forma mais criteriosa?
NM - Claro. Eu era consciente, já era um adulto pensante que vivia sozinho desde os 17 anos. Então, sabia o que me interessava e o que não me interessava. E eu simplesmente odiava aquela ditadura militar. Tudo o que fiz era frontalmente contra aquilo. Você não podia expor o que pensava, três pessoas não podiam se juntar em uma esquina, não se podia raciocinar de forma diferente de quem comandava. E eu era absolutamente contra tudo aquilo, e deixava claro que era. Por outro lado, nunca fiz política partidária, que não me interessa. Entrei nessa exigindo, sobretudo, minha liberdade de expressão. E o fiz fingindo e ignorando que vivíamos sob uma ditadura.

19 maio 2011

DEZ MELHORES DISCOS DO BRASIL DE 2010 - PARTE II



"Djavan é o seu c*. Meu nome é Jeff Goldblum"

 ENTREVISTA PARA A REVISTA DIFAMAÇÕES – SEGUNDA PARTE

Por Django Santana

Veja só que intrigante...
Meu Deus não me diga. Não me diga que  o Teatro Mágico vai começar a fazer cover do Dominó.

Sua lista, ‘Valesca’. Até agora, só cantoras.
Antipático, isso, não acha?

...por que seria?
Porque apesar de estarem entre os dez mais, elas não têm nada de extraordinário. É forçado dizer que ‘todas-são-iguais-e-querem-parecer-a-Marisa-Monte’. Algumas querem parecer a Marisa Monte montada em um jumento no meio de um picadeiro. Outras querem parecer a Marisa Monte imitando a Clara Nunes. Outras querem parecer a Clara Nunes imitando a Pitty. A Tulipa Ruiz, por exemplo, é muito diversa da Silvia Machete. A Silvia Machete está há alguns quilômetros da Gisele de Santi. E a Gisele de Santi não tem porra nenhuma a ver com Vanessa da Mata. Há nuances aqui ou ali. Mas há uma semelhança fundamental: tudo é morno, sem força. As produções carregam um compromisso com a irreverência e com citações que já está irritando. Precisamos de mais Gladys Knight, não de mais Monica Salmaso. Precisamos de mais Lady Gaga e Robyn, não de mais Karina Buhr.  O cancioneiro nacional está passando por uma ‘kassinização’, e quem está mais sofrendo com isso são as intérpretes.

Por que só citou cantoras americanas? Ninguém aqui serve? Ninguém presta? Tudo está sempre uma bosta pra você?
Bosta é a Difamações. Tudo o que citei alcança, no máximo, o epíteto de ‘merdinha’. Posso citar a Daniela Mercury, se quiser, que é uma intérprete sensacional. A Ana Carolina de vez em quando acerta. A própria Gisele de Santi mesmo quase acertou na mosca, mas entregou seu disco de estreia no grito, com peças muito enjoadas. Quando cito Gladys Night, lembro da necessidade do épico, do grandioso, do espetacular em discos mais feminis. Quando cito Lady Gaga e Robyn, lembro da necessidade de transformar ou maquiar velhíssimas fórmulas com novidades arrebatadoras. Não estou vendo ninguém fazer nada além do que o Kassin pediu. A coisa anda tão xumbrega que a intérprete feminina mais inclinada à grandiosidade que temos é o Ney Matogrosso.

E Ivete Sangalo cantando Roberto Carlos?
É o Holocausto revisitado. Fukushima em Angra dos Reis.

Quem é Roberto Carlos pra você?
Um peralta. Um organismo curioso.

‘Why’?
‘Because’ não sabemos se ele é doidamente estúpido ou escandalosamente sagaz. Do início da carreira até os anos 80, acertou em praticamente tudo. Comercialmente e esteticamente. Depois disso, quis virar o Waldick Soriano. Um pouco mais tarde, quis virar o padre Zezinho. Hoje, acho que ele quer ser a Irmã Dulce. Está lá com o cóccix abarrotado de notas de 100. Se quiser, pode ser o Executivo, o Legislativo e o Judiciário de Cachoeira do Itapemirim que ninguém vai dar um pio. Mas conheço muita gente que iria vestida de Mark Chapman a uma convenção de fãs dos Beatles só em reação a mais uma execução inédita de ‘Nossa Senhora’.

Tá. E em quinto, boneca? Algum da Maria Rita?
Vai soar irônico e antipático, mas a partir daqui não tem mais cantoras. E quem leva o cheque de 100 reais é o The Israeli Choro Ensemble, do Chorolê. 


Nunca ouvi falar nessa merda.
E vai continuar sem ouvir. Se você quiser chamar a atenção de alguém, não monte grupo de choro. É tudo muito igual, as peças não mudam, os instrumentos não mudam, a cara de acadêmicos de classe média alta com ânimo antropológico não muda. A não ser que você queira chamar atenção por estar fazendo merda. Esse grupelho aí tenta vender um diferencial, que é o de enfiar esboços de orientalismo em algumas peças. Metade dos caras veio de Israel. Só que essa mistura só acontece em duas faixas: ‘Pra lá de Bagdá’ e ‘Shri Hatembel’. A primeira, por sinal, é excelente. As demais são muito bem executadas, e uma delas, ‘5 de agosto’, é uma das peças mais belas do estilo. Parece coisa do Godofredo Guedes. Só essas duas valem o disquinho. O resto se encontra em qualquer um dos zilhares discos de choro que saem todos os dias de nossas vidas.

Prossigamos. Em quarto?
‘Ao Vento’, de Pedro Tagliani.


Quem, meu filho?
Gal Costa.

Repete. Nunca ouvi falar na vida em tamanho embuste ou seja lá o que for isso.
O Pedro Tagliani é da estirpe do Guinga, e ‘Ao Vento’ é todo instrumental.  Seria mais um de milhares de disquinhos instrumentais para restaurante lançados às toneladas diariamente com fundos de patrocínio. A diferença é que esse sujeito, quando compõe bem, decide investir nos arranjos e entrega peças comoventes, pouco ignoráveis. Até você pararia de almoçar pra escutar com mais atenção. Quando compõe estudos, ou seja, pra si mesmo, destrói o violão. No fundo, no fundo, só trouxe esse disco pra lista por causa da peça ‘Lá vem ela’, que é inacreditável.  Muitos virtuoses com cara de bunda irão nascer e morrer 412 vezes e não farão uma peça como essa.

Que trágico. Em terceiro?
O disco de um sujeito que sofre de um estranho fenômeno de subestima: DNA, do Jorge Vercilo.
 

Puta merda, o Djavanzinho? Não esperava isso de você. Isso é opinião de cantor de barzinho. Surdo, de preferência.
Quem diz que o Vercilo é cópia do Djavan está pensando com a cabeça. Só que não é nem com a de cima, nem com a do meio. É com a cabeça do dedão do pé. Se alguém quiser demonstrar que realmente não conhece nada da discografia dos dois, é só soltar isso aí: ai, o Vercilo chupa o Djavan. Então toma no cu. Isso é preguiça. Preguiça de pensar além de uma opiniãozinha meia boca surgida lá no começo da carreira do Vercilo. Um negócio que foi crescendo, crescendo, crescendo até virar um corolário pétreo, uma certeza divina com direito a versículo, um exercício entediante de senso comum. Já ouvi minha vó dizer que o Vercilo é cópia do Djavan. E ela só escuta padre Zezinho. Já ouvi o pedreiro que trabalhou na casa da minha mãe dizer que o Vercilo é cópia do Djavan. E ele só escutava a voz da minha mãe dizendo ‘termine essa porra’.

Então você é o ‘diferentão’ da turma, o ‘iluminado’?
Sou o cara que escutou os discos. Dá pra dizer que a Nairê copia o Chiclete com Banana. Dá pra dizer que a Claudia Leitte quer ser a Ivete. Dá pra dizer que o Egberto Gismonti quis ou quer ser o Tom Jobim. Dá pra dizer que as bandinhas de pagode romântico ou samba soul se imitam desesperadamente. Mas não dá pra dizer que o mesmo acontece entre o Vercilo e o Djavan. Não baseando-se no trabalho autoral de um e de outro. Vercilo não tem a malícia do Djavan. Não tem a voz do Djavan. Não tem o cabelo do Djavan. Não tem a filha linda do Djavan. Não tem a sofisticação do Djavan. E mesmo do jeitinho dele, mais aguado, é bom pra caralho. E lançou um disco até muito superior à proposta do ‘Ária’, uma coleção meio xumbrega de versões que o alagoano lançou ano passado.

Nossa, esse ‘DNA’ deve ser um discão (bocejos).
A Difamações é que é ótima. Você é que é ótimo. O máximo que ‘DNA’ consegue é ser é melhor que Nairê.

Então qual é a graça dele?
Em um primeiro plano, mostra que Vercilo já transita com segurança por várias colorações, várias estéticas. Não há nada ali soando como uma primeira incursão, como sofisticalismo vazio. Segundo, mostra, de novo, que o cara sabe compor. Inclusive quando invoca o mestre aqui ou ali. O que existe de Djavan em ‘Cor de Mar’ e ‘Ventos Elísios’, por exemplo, não soa como uma cópia safada, mas como saudável influência. E se alguém insistir que é cópia, que agradeça, porque imitar Djavan tentando fazer outra canção não é pra qualquer Zé Ruela. E seria muito melhor pro Djavan fazer algo como ‘Cor de Mar’ do que papagaiar Gilberto Gil em um disco de covers enquanto está fantasiado de Chris Brown na capa.

Não aguento mais falar em Vercilo. Passemos ao segundo colocado.
O segundo fica com a obra de um sujeito que considero um grande pé no rabo, mas que acabou me surpreendendo terrivelmente. ‘Sem Destino’, de Luiz Tatit.

 

Ô escolhazinha acadêmica. Listinha de merda. 
Sabe por que é acadêmica? Porque os discos do Tatit têm um apuro lírico que irrita. É a famosa assepsia da escola paulista. Mas aqui no ‘Sem Destino’, não. Claro que estão lá as letras imensas, impossíveis de decorar, cheias de figuras de linguagem, com aqueles penduricalhos de doutorando em figurativismos, de rato de teorias literárias. Mas o que se faz maior mesmo é o que está no background dessa aula porre de Saussurre. E o que está no background é um trabalho melódico e harmônico muito, mas muito acima da média. Não é um disco bom apenas para um professor de português historicamente mais preocupado em fazer letras ‘didáticas’. É um excelente disco comparado com qualquer coisa.

E quem leva a melancia de ouro? Quem é o abençoado que tocou mais fundo seu horrível coração?
Curioso que nem me sinto tão péssimo quanto achava que me sentiria em citá-lo. O autor do disco mais fodão de 2010, pasmem, foi a porra do Carlinhos Brown.

Não, cara, repete isso.
Carlinhos Brown, ‘Diminuto’.
 

Quem escolhe Carlinhos Brown pra listas de nada? Só se for pra lista dos peitorais mais peludos da música nacional. Senhores, desconsiderem. O senhor crítico aqui é um fanfarrão. Está é de brincadeira.
Desconheço totalmente a discografia desse sujeito. Pra mim, ele era aquele gorila gritando ‘a namorada’ pra Sandra Bullock enquanto usava um cocar de plástico. Ou ainda o merdinha agraciado com uma chuva de garrafinhas de água mineral em pleno Rock in Rio. Ou seja, não sei quem é Carlinhos Brown. E mesmo assim, esse disquinho se mostrou absolutamente tocante. É uma obra de estudos de choro e antiguidades meio rococó, límpida, CDF, lenta, até antiquada, mas com o melhor repertório possível pra quem se mete a fazer uma coisa dessas. Não é extraordinária. Assim, aliás, como nenhuma outra aqui é, pois como já cansei de ressaltar, a criação nacional fervilha, mas ainda não decidiu pra onde vai. ‘Diminuto’ é um disco de estudo. É um disco de um sujeito que quer mostrar que sabe fazer outras coisas. E sabe mesmo. Uma obra que possui peças como ‘Veleiros Negros’, ‘Centro da Saudade’, ‘Você merece samba’ e ‘Verdade, uma ilusão’, nas versões com as quais foram apresentadas, não pode ser ignorada por quem tem pelo menos um ouvido saudável. ‘Diminuto’ é mais do que um arregaço. É a redenção de Carlinhos Brown de qualquer lixo ou nojeira que ele possa ter feito no passado. Não que eu saiba.

Meu Deus, chega. É um alívio encerrar aqui esta entrevista, esse verdadeiro show de pataquadas que foi essa lista e me livrar de uma vez por todas do sr, Igor Matheus.
Será sempre um prazer devolver a Difamações e todos os seus repórteres ao lugar de onde eles nunca deveriam ter evadido: à sarjeta.

Sempre simpático. Algum recado final?
O pé.

Que pé?
O seu. Voltou a se depositar em cima do centro. E acho que ele não foi parar lá por si mesmo. Tire essa merda daí.

27 março 2011

2010: OS DEZ MELHORES DISCOS DO BRASIL (PARTE I)

Clarinha, vai me desculpando pela primeira frase desse texto. 
O atual cancioneiro brasileiro é uma bosta. Um negócio tão enjoado, porre e cara de cu que só foi o cabra aqui prometer uma lista déctupla de coisas mais ou menos audíveis de 2010 que tudo se converteu em um grande hiato flamejante de preguiça e má vontade. A culpa é de Paul McCartney. Porque na tentativa de me recuperar de cada um dos discos nacionais muito ruins que tive de reouvir, me entregava à sua carreira solo. E isso é grave, uma vez que a discografia disso aí enfileirada no chão pavimenta facilmente a futura Aracaju/Brasília.

Gostaria muito que essa barafunda que ganhou na testa o carimbo de ‘muzica brasileira’, essa aí atual, universitária, capenga, revisionista, intelectualóide, deslumbrada, tomasse no epicentro mediano do olho do cu pelos próximos 20 anos. Mas ainda é possível se divertir um pouco com sua miséria. Por isso tratarei de encerrar aqui esse intróito. E partir para um exercício de imbecilidade mais incisivo. Porque a única forma de falar de merda com propriedade é fazendo merda com propriedade.  

ENTREVISTA PARA A REVISTA ‘DIFAMAÇÕES’

Por Django Santana

Bebe?
Não.

Por que não? Crente?
Porque sou um androide do futuro movido a hidrogênio líquido e álcool atrapalha minhas funções mecânicas?

Que idiotice é essa agora?
A Difamações é a pior revista que existe. Quando ligaram pra cá agendando achei que fosse a Veja ou a Rolling Stone.

Você pode ser chato pra caralho, mas não tem peso pra uma Veja ou Rolling Stone.
Por isso aprendi a me contentar com bosta.

Que fofo. E a música brasileira?
Por que não falamos sobre os diversos tipos de ioiô que existem? Conheço uma piada sobre redes sociais.

Não vim aqui pra fazer amizade.
Então já sei que essa merda vai ser uma grande aporrinhação.

Quem ainda fala ‘aporrinhação’ por aí?
O que você quer?

Bem, o pauteiro me disse que você acha essa atual MPB uma merda. E nós da Difamações queremos ver o circo pegar fogo. Queremos artistas de cabeça quente mandando você ir pro inferno em cartas apaixonadas. Afinal, você foi aquele cara que foi ameaçado e tal...
Tá. Tire a pata repleta de coliformes fecais de cima do centro.

...
Bem, não sou daquele tipinho sub-conspiratório que acha que a MPB foi pra puta que pariu e morreu, por exemplo. Acho que ela está apenas em um grande sono de beleza. Estamos vivendo agora algo um pouco parecido, apenas um pouco, com aquilo lá dos anos 40. Ninguém fazia nada de extraordinário e tudo era muito parecido, melancólico, revisionista e metido a classudo. De certa forma, é uma crise, mas nada de apocalíptico. Só não existem hoje mais do que 3 discos produzidos nos últimos 10 anos dignos de ser lembrados nos próximos 10.

E quais seriam esses discos?
Não sei. Mas tem que ter um do João Bosco. João Bosco não sabe lançar disco ruim. Desaprendeu.

E Los Hermanos?

Bons, quase que históricos. Mas ainda superestimados. O valor deles é ter erguido uma bandeira estética com a qual muita gente se identificou e tentou copiar. Não é a fórmula da tubaína de tutti frutti, mas é fodão, tem personalidade. Mas tudo isso tirando aquela postura hesitante e negativista deles com ‘Ana Julia’, que é uma postura asquerosa, podre, uma das coisas mais nojentas e infantis da história recente da arte nacional. Quiçá internacional. Quiçá de Michelangelo pra cá.

São sub-intelectuais, então.
Se tenho um sucesso que encheu meu rabo de dinheiro, mulheres e ainda fez com que George Harrison soubesse que nasci, sou grato a esse sucesso, a esse hit, a esse chiclete. Sem mais, meritíssimo. Não existe papinho de ‘nosso público queria ser instigado nos discos posteriores’, como o Camelo falou pra Leda Nagle. Aliás, que entrevistazinha, aquela. Quase virei um skinhead assistindo aquela merda. Qual o próximo passo de alguém que diz tudo o que ele disse ali? Colocar ‘Guerra e Paz’ em cirílico no encarte? Favor tomarem nos seus cus.

Qual o problema hoje em dia? Só querem saber de copiar? Ninguém inventa nada?
Se eu soubesse, começava a fazer consultoria e cobrava mais caro que o Lula vem cobrando pra falar as besteiras de sempre. Não tem isso de ‘o cenário tá ruim por causa disso e daquilo outro’. É possível fazer esses apontamentos com conjuntura econômica, e olhe lá. Com cenário artístico, não. Talvez só muito depois, com algum distanciamento histórico. Não existem fórmulas prontas pra fracasso nem pra sucesso.

E o que eu tô fazendo aqui então? Crítico não existe justamente pra isso?
Não. Crítico geralmente não serve pra nada. Quando serve, serve pra provocar, criar barraco. Mas fingindo que o barraco é intelectualmente fundamentado. O povo gosta de barraco. Ninguém que vem de uma publicação chamada ‘Difamações’ está autorizado a discordar disso.

Que lindo. Já posso te chamar de Michel Foucalt a partir daqui?
Não, mas te autorizo a me chamar de Valesca Popozuda. Só não me faça responder mais coisa sobre Brasil. Vamos falar de Beatles. Vamos falar do MGMT. Vamos falar da Pink. Vamos falar do próximo disco do Morbid Angel.

O que aconteceu de melhor em 2010?
Tirei umas férias no Rio.

Na música nacional, Foucalt.

Pouquíssima coisa. Eu diria nada, mas soaria muito antipático. Pode cortar esse ‘diria nada’ aí na edição final.

Não tem edição final na Difamações.
Quer dizer que se eu falar ‘glande’ vai sair na cara dura?

Teste.
‘Django, não morda aí’.

Pronto, publicadinho. 
Duvido.

O ‘duvido’ também saiu.
Isso não é entrevista. É fluxo de pensamento. É mais um romance ruim do Chico Buarque.

Falando nele, e aí? Morreu mesmo? Ficou nos anos 70 e 80?
Já deveria ter parado. Mas anda tudo tão ruim ultimamente que ainda é possível dar alguma atenção ao que ele faz. Quer dizer, não sei. O último disco dele é impressionantemente chato.

Dizem até que ele ganhou o último prêmio Jabuti só por continuar tendo belos olhos azuis.
Acredito muito mais nesse argumento do que em qualquer outro. Como escritor, ele é um ótimo comedor de atrizes.

Virou crítico literário agora?
Depende. Você virou o João Gordo?

Ainda não.
E se eu abrir essa mala cheia de correntes e facões?

Não tem mala nenhuma aqui.
Tem uma na minha frente. E ela até fala. Não sei ainda se pensa.

Me fale logo da bosta da lista dos melhores de 2010 antes que eu ponha meu sapato delicadamente na sua boca. Prefere uma regressiva ou progressiva?
Anote aí, Alborguetti: em décimo, Luisa Maita. “Lero-Lero”.

 
Explique-se.
Não esperava nada desse disco. Escutando com pouco interesse, realmente é impossível notar nele algum diferencial. É necessária alguma boa vontade pra notar alguma coisa que destoe de uma Mariana Aydar, de uma Céu, esse povinho. Mas ela tem alguma coisa.

Sim?
Ela é ligeiramente mais sacana e rústica. Canta com desinteresse. À vontade. Sem arrebatamento. E isso funciona terrivelmente em alguns momentos. Não há muita coisa recente mais sensual do que ‘Aí vem ele’ em termos de interpretação, por exemplo. Mesmo a canção sendo fraquinha. Na verdade, a maioria das canções é fraquinha. É ela quem dá uma melhoradinha com sua vozinha de ninfeta. Daí a lição: precisa melhorar o repertório. Se esse for o único disco da carreira dela, será esquecida rapidamente.

Em nono?
Gota Pura, da Clara Sandroni. 

 
Razões?
Gosto da coragem de um disquinho piano e voz. Nem sempre dá certo. Mas quem sabe mexer com a linguagem vai longe. O Rufus Wainwright fez isso ano passado e acabou fazendo história. A Clara, com aquela voz de Nana Caymmi jovem, não vai tão longe. Mas as canções escolhidas são corretinhas, adequadas e agradáveis. Não vai mudar a vida de ninguém, e pode até cansar lá pela décima faixa. Mas é um disco harmonicamente suculento. Dá pra pular disso aí para um disco de pecinhas de Villa Lobos sem grandes saltos. É um disquinho de sarau, só que bom.

E?
Em oitavo não tem jeito. Fico com aquele ‘Quando o canto é reza’, da chatinha da Roberta Sá mesmo. 

 
‘Chatinha’ da Roberta Sá?

É. E é muito ela estar nessa lista aqui, porque é muito difícil gostar dela. Robertinha é uma patricinha raizeira. É tão asséptica e sem graça que dá pra entender perfeitamente porque ela é, hoje, um ícone do ‘samba universitário de raiz’, o samba de partitura, de calourada de faculdade, corretíssimo, afinadíssimo, equalizadíssimo, produzidíssimo e chatíssimo. Só que ela resolveu gravar um disco com o Trio Madeira Brasil. E o Trio Madeira Brasil é de arrombar. O disquinho ficou bem rústico, com canções bem escolhidas. E a vozinha de restaurante dela ficou bem valorizada. Se daqui pra frente ela prometer sempre sair do estúdio com algo assim, prometo tentar prestar atenção.

Todo mundo gosta de Roberta Sá. Você é coprófago?
Não existem regras pra samba, mas uma coisa parece sempre ser reforçada quando surge alguém como ela, limpinha e com currículo de miss formada em Direito e Veterinária: samba é o idioma da malandragem. Muitos podem até balbuciar ele. Mas falar com fluência, só malandro. A mesma coisa acontece com o choro.

Tá. Quem em sétimo?

Vanessa da Mata, ‘Bicicletas, Bolos e Outras Alegrias’. 


É um daqueles disquinhos produzidos pelo Kassin. E o Kassin não é nenhum Midas, mas é uma figurinha importante. Só acho chato pra caralho esse negócio de flerte com o brega, com o tecno brega, com bostas que sobrevivem no limbo e merecem o limbo, mas que alguém teima em sofisticar. Não vi ninguém ter boas ideias com tecno brega ainda, por exemplo. Mesmo assim, Vanessinha não escorregou não. O disquinho ficou divertido.

Em sexto...
Uma outra escolha chata, mas que não tem jeito: ‘Água’, da Paula Morelenbaum e do João Donato.


 
Por que é uma escolha chata?
Porque é canônica, fácil de ser mal interpretada. Vão me chamar de piolho academicista. João Donato é um decano da Bossa Nova. Paula Morelenbaum é daquelas divas de estúdio, academicíssima. Só que a soma de duas coisas assim costuma dar é errado, ao contrário do que pensam muitos. Mas até que a junção funcionou aqui. O disco é muito bem arranjado, o que salva a falta de força das canções. E o piano de João Donato é o piano de João Donato. ‘Água’ é bom principalmente porque poderia ser um erro desastroso e repetitivo, um exercício rançoso de revisionismo. Mas é só legalzinho nos seus melhores momentos e bem sonolento nos piores. E isso é muito.

Chatinho e já está aqui, em sexto?
Leia a entrevista que você mesmo está fazendo e veja minhas ressalvas. Não tá fácil pra ninguém não, rapá. A MPB vai mal, está uma bosta. E a culpa não é do Restart. 

(... continua)

06 março 2011

ATRASADO, MAS NUNCA EM BRANCO: GEORGE HARRISON NÃO É O TERCEIRO DO PÓDIO

Significa.
Antes de mais nada, uma reparação de um harrisoniano de ouvido aberto: quem conhecia e achincalhava a carreira solo de Paulo McCartney Soares guiando-se apenas pelo inviável ‘McCartney I’ e pelo perebento ‘Tug of War’, como eu, paga a língua terrivelmente quando se aprofunda com seriedade no trabalho do sujeito. Eis então um raríssimo – e porque não único – momento de reconhecimento de um sério erro neste blog perfeito e sem rasuras: McCartney não é o nosso mr. Mais ou Menos na carreira solo. É um criador monstruoso. Erra muito, conhece o piegas pelo lado de baixo e tem um curioso talento para acariciar inacreditáveis porcarias em sua discografia semi-zappiana (fodam-se; pesquisem). Mas suas joias não são o tipo de coisa que alguém irá superar semana que vem. Guiando sozinho, é o melhor de todos os quatro.

Se McCartney é o rei apolíneo da beleza maiúscula e Lennon o sultão dionisíaco das baladas afiadas, nada restaria a Jorge Harrison a não ser o cetro de um bocó ressentido e invejoso; ou a pecha de sequelado que nunca resvalou na pata da ameba situada sobre os ácaros das células epiteliais de seus dois ‘algozes’. Só que essa teoria, difundida entre os admiradores mais carniceiros da maior dupla sertaneja de Liverpool, é ignorante e surda. A carreira solo de Harrison é assustadoramente brilhante. E aparentemente mais influente na carreira dos outros do que as dos outros na dele. Apesar de ter sido provavelmente assombrado pela eterna mágoa  ególatra dos coadjuvantes, o guitarrista solo dos Beatles se encontrou. E empatou com as outras duas baleias.

Sua discografia dá um chega pra lá na de Lennon aqui ou ali, mas, no conjunto geral, não supera a de McCartney. Só que há um ponto a favor do nosso amiguinho orientalista: sua lista de trabalhos não apresenta discos inteiramente ruins, como alguns que atentam contra a moral e o patrimônio de sir Paul. A má notícia é que Harrison também não nos legou um long play integralmente genial. O que não significa que coisas como ‘Dark Horse’, ‘George Harrison’ (1979) e ‘Cloud 9’ precisem ficar na mesma prateleira que o inominável ‘Tommy’, do The Who ou de qualquer coisa do The Monkees.

Não vou dissecar a discografia harrisoniana aqui. Ando ocupado demais com o dever de NÃO terminar um post que prometo desde 1432 – um aí sobre as dez coisas mais ou menos da discografia nacional de 2010. Mas é possível reparar, de forma imediata, a aversão de alguns proto-humanos em torno do trabalho do nosso protagonista, aniversariante do último dia 25 de fevereiro e um dos casos de subestima estética mais sérios de todos os tempos. Divirtam-se. Ou morram.






























06 janeiro 2011

2010: OS DEZ MELHORES DISCOS DE HEAVY METAL

Cartaz da clínica de colonoscopia e limpeza intestinal do dr. Vikernes

Vamos: fora daqui agora todos os indiezeiros, fãs insatisfeitos de Vanessa da Mata, a escória que acredita que apreciar Heavy Metal é uma masturbação tecnicista, chicleteiros e ‘ecléticos’ ‘que-escutam-rock-mas-não-gostam-de-Sepultura-porque-não-entendem-o-que-eles dizem’. Aliás, não existem argumentos satisfatórios para rechaçar alguém na última condição. Esse tipo de conduta só se combate com um sonoro e solene 'vá tomar no centro do seu brioco'. Se você se identificou com o último grupo, vá tomar no centro do seu brioco. Se não se identificou necessariamente mas simpatizou, vá também.

Agora espero estar falando com quem entende do riscado. E sim, senhoras, sei que nunca é muito prudente misturar todas as colorações estéticas de Heavy Metal num único balde. Mas não estou interessado em fazer 38 listas específicas e alcançar, em pouco tempo, a proeza de ser um dos 100 imbecis mais chatos da internet – isso se eu já não estiver entre os 1000. E, afinal de contas, como alguém com muita autoridade no assunto disse um dia: diferenças aqui ou acolá, tudo termina com ‘Metal’. E fim de papo.

10- Festival (Jon Oliva’s Pain)


Jon Oliva não é o melhor compositor de Heavy Metal do mundo. Talvez seja apenas o mais gordo. E este projetinho paralelo, como muitos outros projetinhos paralelos, tem aquela aura deprimente de fogo de palha - ou de uma ejaculação precoce artística. Mas o esforço de se construir algo permanente se refletiu em um punhado de grandes faixas. ‘Festival’ não reinventa o metal nem nada, mas em alguns momentos, com seu melodismo excêntrico, sua indecisão diante do prog metal e até mesmo incursões pastelão pelo jazz, ainda soa melhor do que o próprio Savatage. É como a sobremesa querendo ser o prato principal. E conseguindo.

9 - X (Royal Hunt) 


O sarapatel de hardzão, power, teclados virtuosísticos de progressivo e pitadas de erudito tinha muito para ser um completo cataclisma carnavalesco. Mas graças ao Royal Hunt, é só um nicho que ainda não se encontrou por completo. Ora temos peças de belíssimo acabamento, ora temos babaquices afetadas do tamanho da distância daqui pra Dinamarca deles. Mesmo assim, esse ‘X’ é um disquinho pra lá de audível e acima de todas as pentelhações de Kai Hansen e Tobias Sammet que pululam feito larvas no atual cenário. Não é obra inesquecível – assim como qualquer outra obra do Royal Hunt –, mas também não é ignorável. Acima de tudo, um bom trabalho de uma banda que segue sozinha na – ingratíssima – tarefa de fazer heavy melódico sem exagerar na glicose. 

8 - Belus (Burzum) 

  
Passar dezesseis anos trancafiado não deve ser divertido. Mas foi o que o faz-tudo da egolatria norueguesa Burzum, Varg Vikernes, pediu para acontecer quando despachou na faca o sr. Euronymous de Jesus em 1993. Mesmo em cana, o sujeito até gravou uns disquinhos aí, mas em 1999 arremessou tudo pra cima. Pelo menos até conseguir sair do hotel zero estrela no início de 2010. Imediatamente, Vikernes voltou ao batente. E fez com que todos percebessem que a expectativa diante de um trabalho de Black Metal de alguém que acaba de voltar do inferno é um troço meio único. Na contramão de todos os impedimentos que poderiam marcá-lo como um equivocado ensaio de ressurgimento, ‘Belus’ soma acertos naquilo que, em outros trabalhos, seriam zona fértil para erros: qualidade de fita cassete, atmosfera low tech e certa ingenuidade melódica. Tudo converge para a elaboração de um redemoinho sonoro que, se não  chega a ser diabólico, é subterrâneo de tão pra baixo. Uma obra para se escutar sozinho, em dias cinzas e sem nenhum objeto pontiagudo em um raio de 17 km.

7 - The Return To Darkness (Demonic Resurrection)


Há algum tempo, afirmar que havia boas bandas de heavy metal em um lugar como a Índia teria o mesmo valor de xingar a própria mãe. Afirmar que havia boas bandas de heavy metal extremo em um lugar como a Índia, então, equivaleria a xingar a própria mãe e a amaldiçoar a própria vó duas vezes. Mas esperar que além disso também houvesse, lá, gente gravando discos muito acima de razoáveis na estilística seria, no mínimo, passar vergonha. Só que foi justamente isso que a hindu Demonic Ressurrection fez em ‘The Return To Darkness’: um trabalho consistente, soberbamente bem produzido, técnico e com muito mais boas ideias do que tudo aquilo que um Dimmu Borgir ou um Tristania querem nos fazer acreditar que está audível. Um efusivo salve, portanto, para as vídeo-aulas de guitarra do Youtube – uma das poucas coisas realmente úteis e universais que existem.

6 - Jupiter (Atheist) 

  
Pouco antes do Death de Schuldiner se converter em mito do metal trabalhado, o Atheist já destruía neurônios alheios com seu som truncado e esquizofrênico. Até interromperem as atividades em 1993, o bando entregou três disquinhos marcados por um desafio aos ouvintes: lembrar de tudo o que eles tinham acabado de fazer na faixa após uma audição. Ou dez. E não deixa de ser inacreditável que este ‘Jupiter’, primeiro disco dos sujeitos após 17 anos, soe exatamente como se fosse o quarto álbum pra-frentex da banda, e não uma espécie de ré em nome do didatismo e da conveniência. Em português corrente: o Atheist 17 anos mais velho continua truncado, esquizofrênico e ainda melhor do que sempre foi.

5 - 7 Sinners – (Helloween) 

  
Se esses caras tivessem sucumbido às infinitas brigas que resultaram nas 487 mudanças de formação, ainda sim teriam uma séria lista de contribuições ao metal mundial para exibir. Mas esses filhos da puta são estradeiros e viciados em tentar lançar o mesmo disco a cada dois anos. É verdade que a patota de Andi Deris nunca mais conseguiu entregar uma monstruosidade definitiva como ‘Better Than Raw’ (onde estará você agora, Uli Kusch?). Mas o mero exercício do desafio ainda gera excelentes peças isoladas. É o que acontece com interessante frequência em ‘7 sinners’. A História ainda explicará porque cacete eles resolveram iniciar um disco tão violento com uma semi-balada. Jogassem-na como bônus, ou jogassem-na como intermezzo, ou jogassem-na fora, ou, ainda melhor, jogassem-na num disco do Gamma Ray. O que interessa é que o Helloween deu mais uma demonstração de que, mesmo não conseguindo voltar ao topo em que já esteve, não irá desistir de tentá-lo tão cedo.

4 - Erebos (Hate) 

  
A primeira coisa que o Hate deve ter como foco em 2011 é demitir sumariamente quem quer que tenha pensado suas vestimentas no encarte disso aqui. A foto do miolo é, de longe, uma das coisas mais bisonhas e engraçadas que a estética do Heavy Metal extremo pode reservar para os mortais. A bolacha, por outro lado, é uma bruta compensação a essa comicidade acidental. Porque ‘Erebos’ é de uma sisudez terrível, incansável, sólida. Há quem diga que tudo o que eles fazem não é mais do que um scanner mal feito de seus conterrâneos do Behemoth. Mas não há como apreciar uma obra como essa estabelecendo-a como ‘sub’ de alguma coisa. Trata-se, antes de qualquer comparação, de death metal puro, inteiriço e direto. Ainda que seus feitores ainda tenham alguns problemas com... fotogenia. 

3 - Starve For The Devil (Arsis)

  

A sonoridade pré-Symbolic (é, do Death) disso aqui é tão semelhante ao de uma finada banda baiana chamada Tharsis que é de se pensar se o tal do James Malone, mentor intelectual e ético-epistemológico do projeto, não cresceu ali entre a Pituba e o Rio Vermelho e resolveu excluir de sua vida os carnavais de Soterópolis e os ‘t’s e ‘h’s. Mas ainda mais do que uma simples pesquisinha no Wikipédia, o que desmente essa medonha coincidência é o fato de Malone não ter encontrado, nos EUA inteiro, um baterista melhor do que encontrou seu correlato baiano. Só que a relativa crueza não chega a ser um grande problema para o Arsis em ‘Starve For The Devil’. Mesmo sendo obra generosamente complexa, o entendimento de que há um nível diferenciado de inspiração em cada faixa está escrito na testa de tudo. E apesar da horrível capa, sombria e black metal demais para um som isento de qualquer fagulha de teatralidade controversa, ‘Starve’ reivindica com justiça o respeito que se deve ter com a ala que,  ainda, é responsável pelo que há de melhor no metal atual. 




2 - Time To Be King (Masterplan) 

  
Está provado cientificamente: é a má vontade da maioria das bandecas que enterra o power metal na vala comum do repeteco e do auto esgotamento. Se não fosse, não seria possível que um dos discos mais poderosos do estilo pudesse ser feito mais de 10 anos após o lançamento de suas obras definitivas. E é isso que ‘Time To Be King’ é. Claro que a presença de um cavalo como Jorn Lande em um projeto sempre será digna de atenção e sempre somará mais do que o normal. Mas ainda é necessário muito mais do que um vocalista sobre-humano para se alcançar o pico. É aí que entram as composições – principalmente o excepcional trio inicial – e um time de músicos mais interessado em fazer da técnica um artifício do que serem, eles mesmos, artifícios da técnica. Eis o resultado: um trabalho poderoso, maciço, elaborado e que demonstra, em uma hora e pouco, o quão inesgotável pode ser uma estilística relativamente cansada quando se tem boas ideias.




1 -
Periphery – Periphery Instrumental

Depois de quebrar o mundo e o fundo com uma excepcional demo instrumental lançada em 2008, esses sujeitos ingeriram chumbinho – do ponto de vista estético – e decidiram se converter em um Linkin Park para ouvintes de Q.I. alto no criminoso ‘Periphery’ (2010). Mas antes que seus antigos admiradores lhe virassem as costas, o bando jogou na praça uma versão do mesmo disco sem os vocais. Sim, há um ou outro cacoete que eles poderiam ter deixado nos piores momentos do Limp Bizkit. Mas se a obra não se aproxima da excepcionalidade da demo de outrora, passa na frente de tudo o que foi lançado esse ano no esforço. Enquanto os vocais fazem o Periphery parecer ter quinze anos e espinhas purulentas até dentro do nariz, a ausência deles faz as faixas abraçarem o gigantismo de um pesadíssimo metal polirrítmico à moda do Meshuggah. E quem conhece os suecos sabe muito bem que é preciso muito mais do que coragem para encostar pelo menos 3 cm naquilo que eles fazem. ‘Periphery’, o ‘Instrumental’, não é disco pra criancinha, não é disco pra pagodeiro, não é disco pra quem quer começar a escutar metal, não é disco para se dar de presente pra namorada, não é disco para quem pretende estudar bateria – mais fácil indicá-lo para quem quer motivos pra parar. Mas é, definitivamente, a única coisa que o Periphery deveria ter lançado em 2010.






Um lixo:
Option Paralysis (The Dillinger Escape Plan) 

  
Em um primeiro momento, soa ruim. Em um segundo, pior. Em um terceiro, qualquer coisa diferente disso já está ótimo para que o dia volte a ficar bom. Neguinho que fica indicando isso aí pros outros merece é ser preso. 



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